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Como responsável por inteligência artificial no Uber vê o futuro do carro

Para Steven Choi, se depender de tecnologia, não vai demorar até que os veículos autônomos reinem na rua — no entanto, a questão vai muito além


Época Negócios


Apesar da pouca idade, Steven Choi tem uma grande responsabilidade nas mãos. Aos 33 anos, ele é gerente de produto sênior para machine learning (aprendizado de máquina) e inteligência artificial do Uber. O rapaz é um dos responsáveis por garantir que os carros autônomos que vêm sendo produzindo pela empresa sejam capazes de operar com o mínimo de intervenção humana possível. No cenário ideal, sem nenhuma. Choi assumiu o posto há menos de dois meses. Antes disso, atuava no GoogleX, a divisão "secreta" do Google, dedicada a projetos inovadores. Nesta semana, ele veio ao Brasil para participar da V Conferência Global PARAR, do Instituto PARAR. Em entrevista à Época NEGÓCIOS, ele fala sobre como enxerga o futuro do carro e das ruas. Segundo o executivo, o principal obstáculo para a implementação dos autônomos não é a tecnologia — vai além. Confira:



Com a ascensão dos carros autônomos, é possível que um dia deixemos de ter automóveis próprios?

Eu não conseguiria prever com precisão como o ambiente vai mudar no futuro, mas isso é o que apontam as tendências. Estaríamos nos movendo de uma realidade em que as pessoas são donas de seus carros para uma em que o veículo é compartilhado. Se o automóvel autônomo for implantado de vez, não haverá mais necessidade de ter um carro. Os custos de usar uma plataforma de transporte contra os de ser dono de um veículo teriam uma diferença muito significativa. Hoje, em mais de 90% do tempo, os automóveis não são usados como poderiam — isto é, estão estacionados, parados no trânsito ou simplesmente sem uso. Uma plataforma de transporte com carros autônomos poderia resolver esse problema.


Se nós pudéssemos viajar no tempo para 2037, daqui 20 anos, como seriam as ruas que encontraríamos?

Daria para conversarmos bastante tempo sobre isso. Infraestrutura é a chave para o sucesso de qualquer tecnologia. Para carros começarem a operar em massa, no começo do século XX, tiveram de construir estradas e estacionamentos. Se os carros autônomos forem implantados, você poderá eliminar entre 70% e 80% dos veículos no mundo [por causa do compartilhamento]. Isso não vai chacoalhar só a indústria automobilística. Trará disrupção em vários níveis. As estradas poderiam ser mais estreitas e os estacionamentos poderiam ser menores — porque você não precisa mais estacionar os carros. O setor de seguros é um que pode sofrer, por exemplo, pois haverá menos acidentes. O mercado imobiliário também pode ser impactado, já que teremos mais espaço. Além disso, a forma como a polícia trabalha pode mudar — o sistema de multas não vai mais gerar tanta receita. Já do ponto de vista logístico, mover algo de um lugar para outro poderá mudar também as coisas, já que veículos autônomos dirigem 24 horas por dia, não precisam “descansar”. E a lista segue… Deve haver uma grande mudança em infraestrutura, mas será nos próximos 100 anos — não um impacto tão imediato.


No ritmo em que a tecnologia tem avançado, quanto tempo deve levar até que tenhamos mais carros autônomos nas ruas do que os tradicionais?

Se fosse uma questão só de tecnologia, diria que chegaríamos lá nos próximos cinco anos. Mas há outro fator: o regulatório. Governos precisam autorizar esses carros. Quem sabe quanto tempo isso pode levar? As companhias aéreas demoraram cerca de 20 anos para solidificar essa questão. Esta semana o Waymo [divisão do carro autônomo do Google] acaba de demonstrar nos EUA que já é capaz de operar um veículo com segurança — e sem motorista. Portanto, a tecnologia em si está amadurecendo.


Mas parte da massificação dos autônomos também esbarra na aceitação do próprio público, não é?

Sim, definitivamente. A experiência do usuário, como nós chamamos, é a maior luta além das questões regulatórias. Mas o que eu posso te dizer é que máquinas são capazes de processar e catalogar informações muito mais rápido que o cérebro humano. O AlphaGo, do Google, derrotou o melhor jogador de go do mundo no ano passado. É uma façanha que humanos pensavam que as máquinas nunca seriam capazes de realizar, mas atingiram em um espaço de tempo bem curto.


Qual o maior desafio que vocês enfrentam hoje no desenvolvimento dos veículos autônomos?

Todos os dias o que nós procuramos é chegar em um nível de inteligência artificial completa. Existem diferentes estágios de machine learning, evidentemente. Tem a versão mais simples de aprendizado e as mais avançadas. E existem cinco níveis diferentes de autonomia de carros, do ponto de vista de machine learning [de mais dependentes de um humano até sem dependência alguma]. O objetivo dos desenvolvedores é sempre chegar na inteligência artificial completa.


E qual é a diferença entre o projeto do Uber comparado ao do Google?

A tecnologia que estão desenvolvendo, em geral, é a mesma. Tem o mesmo objetivo. Isso serve também para as outras empresas que têm trabalhado com carros autônomos. Mesma missão, mas com ideias diferentes. É só uma questão de quão rápido vão chegar lá. É como uma corrida. Em certo ponto, houve uma corrida entre os buscadores, protagonizada por Google, Yahoo e MSN. Houve uma corrida também de sistemas operacionais de smartphone, com Android e iOS. Houve ainda uma relacionada a quem implantava a rede 4G mais rápido, assim como agora há com 5G. Acredito que a corrida do setor de carros autônomos tem vivido algo semelhante: trata-se de quem chega no nível mais avançado de autonomia primeiro.

E quem está ganhando, por enquanto?

Acredito que o Google. Eles estão desenvolvendo a tecnologia há mais tempo. Provavelmente têm mais dados baseados em testes do que qualquer outra empresa.


Como especialista no assunto, você se preocupa com possíveis riscos que a inteligência artificial possa trazer?

É uma preocupação. Precisamos ser muito conscientes sobre como usamos o machine learning porque ele é baseado em inputs humanos. Os engenheiros que criam o machine learning precisam ser extremamente cuidadosos. Se usado de forma ruim, pode ser prejudicial para nossa sociedade. É como Albert Einstein e a bomba atômica — a intenção dele não era matar pessoas, mas criar energia nuclear. Qualquer tecnologia pode ser usada de um jeito ruim.

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