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Novas tecnologias? Brasil corre o risco de se tornar irrelevante

Num estudo que avalia o grau de inovação de 140 nações, o Brasil ocupa a 69ª posição, atrás de todas as grandes economias emergentes


Por Filipe Serrano


São Paulo — Embora esteja entre as dez maiores economias do mundo, o Brasil tem uma posição para lá de modesta na lista dos países mais inovadores. Num estudo que avalia o grau de inovação de 140 nações, o Brasil ocupa a 69ª posição, atrás de todas as grandes economias emergentes, como China, Turquia, México, Índia e África do Sul.


Para o pesquisador indiano Soumitra Dutta, uma das maiores autoridades do mundo em inovação, o Brasil tem feito muito pouco para mudar esse cenário. Pior: está ficando cada vez mais para trás. Dutta, de 53 anos, é reitor da escola de negócios da Universidade Cornell, uma das mais renomadas dos Estados Unidos, e responsável por desenvolver o Índice Global de Inovação (GII, na sigla em inglês).


Ao longo dos últimos dez anos, o GII tornou-se o principal indicador para comparar o grau do progresso científico e tecnológico entre os países. Formado em engenharia da computação, Dutta virá ao Brasil em junho para participar do Congresso Brasileiro de Inovação da Indústria, organizado pela Confederação Nacional da Indústria e pelo Sebrae, em São Paulo. Durante o evento, vai lançar a décima edição do ranking.


Para o pesquisador, apesar de o Brasil ter empresas líderes em inovação — como a fabricante de aviões Embraer —, falta um plano consistente do governo federal para promover a pesquisa e o desenvolvimento no longo prazo. “O Brasil nunca teve de fato uma estratégia para a inovação”, diz. Relembre: Ciência em crise teme novo corte em 2017


EXAME – O que um país de renda média como o Brasil deve fazer para atingir um alto nível de inovação?

Soumitra Dutta – Nosso modelo de avaliação está centrado em dois componentes principais. O primeiro são os aspectos que potencializam a inovação, as áreas nas quais o país deve investir para fornecer as bases para que a inovação possa ser realizada. São coisas como ter um ambiente político e de negócios favorável, ter uma boa infraestrutura, ter um capital humano de qualidade — tanto no nível da educação básica quanto no ensino superior — e investir um valor adequado em pesquisa e desenvolvimento. O segundo componente são os resultados que o país consegue gerar com os investimentos em inovação. É o dado que mostra se as iniciativas estão tendo êxito. Portanto, respondendo à sua pergunta, acreditamos que, se um país for capaz de avançar em todas essas dimensões, ele poderá, sim, atingir um alto nível de inovação.


EXAME – Quanto tempo um investimento desses demora a dar resultados?

Soumitra Dutta – Demora bastante. Não adianta construir um grande laboratório e esperar que o país se torne líder em inovação. Se fosse fácil assim, muitos países o fariam. A parte difícil de estimular a inovação é justamente aprimorar as múltiplas dimensões simultaneamente. O país precisa ter uma boa educação, precisa de um ambiente de negócios sofisticado, precisa de infraestrutura de boa qualidade. É muito importante ressaltar que os países que vão bem no índice são aqueles que têm resultados positivos em todas as dimensões. É por isso que fazer inovação é tão difícil.


EXAME – O mais importante é seguir uma estratégia de longo prazo?Soumitra Dutta – Sim. É preciso ter uma estratégia de longo prazo para o país. Mas também é importante ter táticas de curto prazo que ajudem a avançar.


Exame – Que táticas são essas?

Soumitra Dutta – É possível realizar ações focadas em áreas específicas que desencadeiem efeitos colaterais. Dou um exemplo que os brasileiros conhecem bem: a Embraer. Por causa do investimento da fabricante de aviões, toda uma cadeia de empresas que trabalham ao redor dela é beneficiada. Ou seja, você pode fazer esforços específicos para criar inovação em setores determinados, como o de aviação, e fazer com que isso se espalhe para outros segmentos. Se você olhar com atenção, foi isso que ocorreu com a indústria de tecnologia no Vale do Silício. O sucesso de uma empresa eventualmente acabou levando à criação de outra empresa de sucesso e depois outra e outra.


EXAME – Desde que o senhor começou a fazer o índice, algum país conseguiu sair de uma posição ruim para se tornar um líder em inovação?Soumitra Dutta – Sim. Alguns países têm subido no ranking consistentemente ou estão conseguindo alcançar os países líderes. O melhor exemplo é o da China, que está se movendo muito rapidamente e, em pouco tempo, entrou para a lista dos 25 países mais bem colocados. Outros exemplos são Coreia do Sul e Israel. O que esses países têm em comum são estratégias nacionais de inovação. Ter um planejamento consistente é importante para progredir. Catalisador: No mundo da inovação, universidade é agente de desenvolvimento econômico, diz especialista


EXAME – Como o senhor avalia o desempenho do Brasil no ranking?Soumitra Dutta – Em 2011, o Brasil estava na 47a posição. No ano passado, havia caído para a 69a. Isso não significa que o Brasil não tenha melhorado. Ele tem feito avanços. Mas essa melhoria é lenta. Não ocorre num ritmo suficiente para acompanhar o progresso feito em escala global. É importante que o Brasil entenda que o mundo tem se movido mais rapidamente. Em outras palavras, o Brasil está ficando para trás. É urgente o país tomar medidas para melhorar sua competitividade. Se não o fizer, a indústria brasileira vai sofrer ainda mais, e o mercado de trabalho vai sentir o efeito. O Brasil corre o risco de não ser capaz de competir numa economia global.


EXAME – Falta uma estratégia?

Soumitra Dutta – Sim. O Brasil nunca teve de fato uma estratégia para a inovação. O governo brasileiro precisa ter um entendimento claro de que a inovação é crítica para o desenvolvimento. Se o país não investir em inovação, não será capaz de se beneficiar das oportunidades econômicas criadas pelas novas tecnologias. Por exemplo: o Brasil tornou-se líder em biocombustível e detém um conhecimento vasto nesse campo. Mas hoje a indústria automobilística toda está se movendo rumo aos carros elétricos. A tecnologia está mudando. O Brasil precisa ser capaz de mudar para competir. Acho que países como o Brasil precisam investir em áreas que ainda vão crescer.


EXAME – Como os países fazem para identificar essas áreas?

Soumitra Dutta – Ninguém sabe. Não há como saber de fato. Mas é preciso tentar. Se tiver sucesso, o país vai criar outros mercados, vai estimular novos negócios. Mas, se não tentar, nunca vai conseguir.


EXAME – O Brasil tem tido sucesso em alguma área em particular?

Soumitra Dutta – O Brasil tem um sucesso tremendo no setor de aviação. A Embraer é um bom exemplo de inovação que não se vê no resto do mundo. Na verdade, somente três ou quatro países são grandes exportadores de aviões. Mesmo a China ainda não conseguiu alcançar esse patamar no segmento. Acho que essa é uma área que o Brasil precisa expandir e ajudar a gerar muito mais empresas. Outra área é a de biotecnologia, no qual o Brasil é forte naturalmente, dado o bom desempenho do agronegócio.


EXAME – Em quais áreas estamos indo mal?

Soumitra Dutta – O setor de tecnologia da informação deveria ser muito mais robusto no Brasil. Atualmente, ele é muito mal aproveitado. A indústria de TI é dominada por empresas globais. E as empresas de software e internet brasileiras são fortes apenas no mercado doméstico, o que não significa muita coisa. Esse é um setor importante demais para o Brasil, uma das maiores economias do mundo, ficar de fora. Mas existem outras inúmeras áreas nas quais o Brasil poderia fazer mais, como a de energia solar. É uma pena que o país esteja perdendo tantas oportunidades.

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